quarta-feira, maio 08, 2002

HOMENAGEM AOS AMIGOS/LEITORES QUE SEI QUE NÃO SAEM DE LÁ.

Hoje vou lá no Bar Estadão [SP] mandar um pernil na frança com cerveja preta. Vou depois das 11 da noite, porque o Amaral só chega às 11. E só o Amaral sabe fazer direito aquele sanduíche de pernil.

Os outros – Carlão, Paulinho etc – são uns inúteis que não prestam nem pra cortar o pão. O Amaral tem a manha. Primeiro dá uma cacetada com a faca no pão, como quem diz "me respeite", e só depois corta. É nessa cacetada que as moléculas da massa se desagregam por alguns culhonésimos de segundo, atônitas e vulneráveis, permitindo que o pão absorva o molho do pernil. A teoria é minha, sou formado em física e metafísica. O Amaral é um negão de lua. Tem dia que não te olha na cara. Tem dia que te recebe de sorrisão aberto, perguntando "beleza?". Não há meio termo.

Na noite o bar é frequentado por taxistas, putas, jornalistas, travecos, policiais, diretorias de escolas de samba, desocupados, estudantes, pessoal de manutenção do trânsito, leitores de blog e até um blogueiro que sou eu. O segredo do sanduíche é o molho de 7 ervas, sempre guardado num galão de plástico na geladeira, e de aspecto estranho, cor esverdeada, pouquíssima gente da casa sabe quais são as 7 ervas. Eu não sei. Se não fosse um trocadilho vagabundo desgraçado, eu diria que se trata de um segredo de Estadão, hehehe, como escrevem nos chats. O resto do tempero fica por conta do caldo gorduroso e amarelado do próprio pernil, com um toque final de requinte a cargo do suor do braço do Amaral. Se você tiver tendências suicidas, pode pedir um pedaço da casquinha de um pernil recém-assado, crocante, pururuca, pura gordura que vai se acumular nas paredes das suas artérias para o resto da vida. Mas é gostoso. Tem cara que manda colocar um pedação dessa casquinha dentro do sanduba. Acho que é cara que tem mulher feia e quer morrer logo. Se você tem em casa um cão merecedor, fique de olho no fim do pernil e peça para levar o osso. Não faça cerimônia, aquilo vai para o lixo mesmo. Eu não sou cachorro não, mas é uma delícia de osso. Eu sei porque já presenteei uma cachorrinha miga minha com um deles, embrulhado no capricho pelo Amaral num saco plástico lambuzado de gordura por dentro e por fora. A pimenta do Estadão é outra iguaria. Lembra muito a pimenta do Bar Leo. Malvada como ela, tem que tomar cuidado. Uma vez um cara me perguntou no balcão do Leo se a pimenta era forte, respondi que sim: "ponha só uma gota". Ele pegou um canapé de carne crua e pingou duas gotas, uma em cada ponta. Avisei: "cuidado, eu te falei uma gota". Ele riu: "vou dar duas mordidas". Pagou caro pela gozação. Lacrimou quinze minutos. Voltando ao Estadão, sugiro um passeio turístico pela cozinha. Fica nas catacumbas do bar. Perto do banheiro de onde se podem ver as calcinhas das mulheres que passam pela calçada pisando na grade de ventilação. Vai você lá. Depois me conta, porque eu nunca fui. Enquanto não instalarem uma câmara de descontaminação na saída, por aquela porta eu não passo. Nem morto.

posted by Sergio Faria at 8:20 PM , do Catarro Verde
fotos by J.Pox, amigo, leitor e punheteiro de coments.