terça-feira, novembro 05, 2002

VOLTAIRE
Saudades de um canalha


A solidão é um dos males da grande cidade.
No Dia de Finados, Odete dava o seu tradicional suspiro.
- O Gonçalves. Era um vagabundo. Mas às vezes eu sinto falta dele.
Dez anos de viuvez. E nada de novo no horizonte.
Aos 55 anos, Odete ainda estava em forma.
- E desfruto de boa situação financeira.
Mas os meses se passavam e Odete continuava só. Passou a sonhar com frequência com o marido.
- Gonçalves. Pára de beber, Gonçalves. Que eu te arrebento.
Saudade, ódio e carência física se misturavam na mente daquela mulher.
- Não sei. Acho que estou tendo visões.
Tarde da noite. O vento afastava as cortinas daquele sobrado da zona norte.
De repente, o vulto de um homem pálido. Os olhos roxos.
Sangue escorrendo pela boca e pelo nariz. Odete achou que era fantasma.
- É você, Gonçalves?
Não era. Era o detento Alcir. Baleado. Fugindo de uma revolta no presídio. Odete abriu a janela e o coração para o visitante noturno.
Nunca faltam malandros para a mulher que quer dar o seu amor.